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julho 31, 2004

Segredo

Não contes do meu vestido
que tiro pela cabeça
não contes
Não contes que corro os cortinados
para uma sombra mais espessa
não contes

Deixa que feche o
anel em redor do teu pescoço
com as minhas longas pernas
e a sombra do meu poço

Não contes do meu novelo
nem da roca de fiar
não contes
Não contes o que faço com eles
a fim de te ouvir gritar
não contes

Deixa que feche o
anel em redor do teu pescoço
com as minhas longas pernas
e a sombra do meu poço

palavras de Maria Teresa Horta
cantadas por Cristina Branco (uma mulher iluminada)
ao som da guitarra de Custódio Castelo

julho 29, 2004

estive a posar para fotografias de nu artístico. o rapaz que me tirou fotografias é amigo de um grande amigo meu e só nos conhecíamos superficialmente, de vista, de festas, sei lá eu. aceitei porque, quando o rui me perguntou se eu estaria disposta a tal, não me ocorreu nenhuma justificação para a negativa.
a meio da sessão, o carlitos (ele prefere que lhe chamem cajó, mas eu tive algum prazer em ignorar essa preferência) começa a falar de sexo de uma forma tão directa e tão técnica que só pude sorrir. nenhum homem fala tão frontalmente de sexo na primeira oportunidade a sós com uma mulher. algo estava errado.
posições, preferências, tamanhos, dicas para seduzir fulano e beltrano, "coisas-que-devíamos-sentir-e-não-sentimos". pergunto-lhe se é gay, resposta afirmativa. pergunta-me ele se eu e o rui "coiso-e-tal". ok, é no rui que ele tem os olhos postos. menos mal. acabada a sessão, cházinho de menta (que new age!) nas almofadas brancas randomly set pela salinha branca.
hora da cusquice, pensei eu. e a primeira perguntou foi a tal: "então e o rui... ele é... bem fornecido?"
não queria responder-lhe. simplesmente. então, disse-lhe, de forma mais elaborada e algo embaraçada, que importante é a fricção entre duas texturas diferentes mas complementares. e para que haja fricção real, o tamanho não é o factor a ter em conta, mas o volume. "então... ele não tem nada de jeito?"

há coisas que estes homens nunca saberão.
Esta é uma canção tradicional rom.
Dedico-a ao grande mestre da voz rouca e envelhecida, Saban Bajramovic.

Trec tiganii

In carute colorate trec tiganii
O tinganca fara fii s-aduna banii
Alta sade intr-o holda cu ghiocul
Sa ghiceasca uneu fete mari norocul
Un tigan canta cu foc dintr-o vioara
Cete de tigani se-ncinse la subsoara

Trec tiganii trec
Se duc si petrec
Trec tiganii nu se mai opresc
Dar ei se iubesc

La o margine de drum au aprins focul
Si in jurul focului au incins jocul
Noapta e cu luna plina fermecata
Dragostea tigancii n-o uit niciodata
Pe ei fac viata fetei fericiti
Iar tiganii dorm in corturi linistiti

tradução aproximada da minha autoria:

Em carroças coloridas os ciganos vão passando,
uma cigana sem filhos conta as suas moedas
outra num campo de milho com uma concha
lê a sina a uma virgem,
um cigano toca violino com paixão,
outros ciganos dançam numa roda.

Os ciganos vão passando,
vão-se embora e divertem-se.
Os ciganos vão passando, sem parar
mas amam-se.

A berma de uma estrada acendem uma fogueira,
e em volta do fogo começam a dançar.
A noite traz uma lua cheia de magia
e não posso esquecer o amor de uma mulher cigana.
Vivem uma vida feliz,
dormem em paz nas suas tendas.
Antonio Vivaldi, sonata "Cessate, omai cessate" [RV 684]

Largo e sciolto

Cessate, omai cessate,
rimembranze crudeli
d'un affetto tiranno?
Già barbare e spietate
mi cangiaste i contenti
in un immenso affanno.
Cessate, omai cessate,
di lacerarmi il petto,
di traffiggermi l'alma,
di toglier al mio cor riposo, e calma
Povero core afflitto, e abbandonato,
se ti toglie la pace un affetto tiranno,
perchè un volto spietato, un alma infida,
la sola crudeltà pasce ed annida.

Larghetto & Andante molto

Ah ch'infelice sempre
Me vuol Dorilla ingrata,
Ah sempre più spietata,
Mi stringe à lagrimar.

Per me non v'è ristoro
Per me non v'è più speme.
E il fier martoro e le mie pene
Solo la morte può consolar.

Andante

À voi dunque, ricorro orridi specchi,
taciturni orrori, solitari ritiri,
ed, ombre amiche, trà voi
porto il mio duolo,
perchè spero dà voi quella pietate,
che Dorilla inhumana non annida.
Vengo, spelonche amate,
vengo specchi graditi, affine meco involto
il mio tormento in voi resti sepolto.

Allegro

Nell'orrido albergo, ricetto di pene,
Potrò il mio tormento sfogare contento,
Potrò ad alta voce chiamare spietata
Dorilla l'ingrata, morire potrò.

Andrò d'Acheronte sù la nera sponda,
Tingendo quest'onda di sangue innocente
Gridando vendetta,
Ed ombra baccante vendetta farò.


na voz do contra-tenor Andreas Schöll as palavras ganham corporalidade.

julho 25, 2004

eu até gostava de namoriscar e de namorar, de preferência, com pessoas diferentes. não acreditava no amor profundo inabalável que podia unir duas pessoas de tal forma que as restantes ficariam excluídas do resort emocional. e a variedade e brevidade das relações significava, para mim, experiências que se somavam umas às outras, eternamente em busca de um orgasmo ainda melhor que o anterior (se eu pudesse, era a toda a hora!).
nunca acreditei nessa treta de as mulheres só conseguirem ir para a cama com um homem quando sentem qualquer coisa, por muito indefinida que seja, pelo dito mas percebo porque é que surgiu esse tipo de ideia-fermentada-em-cérebro-de-galinha-cocó: quando não há qualquer sentimento pelo homem com quem se está a foder, há espaço de racionalização da acção. o pensamento está completamente focado no momento do orgasmo e a ansiedade mata esse momento.
como o que todas a mulheres querem é sentir prazer, associar a falha do orgasmo à falta de amor é uma boa ideia, com um potencial justificativo que muitos homens não se atrevem a contestar.
pois é. mas é mentira. o truque é só sentir. não necessariamente pelo parceiro, mas sentir tudo o que está acontecer. sentir-mo-nos. e estar realmente lá. toda.
Blogger JPN disse...

cheguei aqui por outros posts mas ao ler este, e não é o primeiro em que se sente a ferida da honestidade, da tentativa de ser frontal, fico um pouco desnorteado. um dia gostava de conseguir falar do sexo desta maneira. não é fazê-lo, porque isso é como tu o dizes, é a presença nele que nos resolve, mas falar dele. falar da forma (aterrorrizada) como enquanto homem cheguei (amos) ao sexo.

14/12/04 03:14  

diz ...

férias (na verdade são 6 dias, mas são todos meus)!
mas a semana é musical e renhida:
ninivitas 28 julho no santiago alquimista pelo fresco
30 de julho: brad mehldau na aula magna ou savina yannatou em sines ?
hedningarna 31 de julho no intercéltico de sendim
regresso ao traballho às 8h30 de dia 1.
se ganhar asas até sou capaz de chegar a tempo.
fechada num elevador lento. sozinha. perco-me.
já não sei se o elevador desce ou sobe, se eu quero descer ou subir.
nem um barulho. os botões desapareceram. e já nem me sinto.

julho 24, 2004

é natural beber de fontes seguras.
melhor ainda quando as apreciamos por inteiro.

gosto muito de catulo, autor que todos os classicistas gostam de incluir nos programazitos académicos mas que nunca é entendido no seu todo. e quando uma aluna atenta lhes chama a atenção para um ou outro pormenor apimentado, sai uma crítica - subtil ou não - ao carácter da dita aluna.
é suposto nós sentirmo-nos embaraçados quando falamos de sexo numa sessão de trabalho numa universidade, sabiam? eu não sabia.
continuarei sempre a amar catulo. e envergonhem-se os outros que não o conhecem e tropeçam num ou noutro verso...


Passarinha, delícia da minha gatinha,
com que ela brinca, que ela abriga na ruga,
a quem ela abre o apetite,
e a quem violenta pontada excita
quando o meu desejo luzidio
sente prazer em gozar não sei que coisa ébria
e um breve desafogar da sua dor -
imagino - refreia também, naquele instante, o entorpecido ardor:
se eu pudesse brincar contigo como ela brinca
e libertar-me dos sôfregos arquejos da vida.

C. Valeri Catulli Liber, II (tradução minha)


ingénuos. acreditavam realmente que se tratava de um pássaro?!
escrito por um dos pioneiros do uso de gíria e baixo calão em latim?
WAGNER

- Mas então... E o Mundo? E a alma... e a mente?
Haverá alguém que não anseie por as conhecer?

FAUSTO

- Pois sim, como se isso fosse conhecimento...
Alguém pode realmente falar do inominável?
Uns iniciados que um dia as vislumbraram,
como loucos, abriram-se aos seus
e falaram de sentimentos e visões luminosas;
No fogo ou na cruz tiveram fim todos eles.
Vêde como sobe a lua, peço-vos:
fiquemos por aqui.

Johann Wolfgang Goethe, Fausto, vv. 586-595 (tradução minha, com uma liberdade nietzscheana)
Faltam algumas peças do puzzle. Umas nove. Endeusadas pela racionalização.
Percebo que tenho medo de avançar, de deixar de sentir o chão. O medo, quando tardio, perde o seu carácter edificante.
A não-reacção no tempo exacto do medo primordial tem como consequência uma capacidade de reacção tardia ou nula perante os medos de todos os dias, mesmo os mais ridículos.
Em dias como este, em noites insomnes como esta, o corpo inquieta-se e espreita a oportunidade.
Se tiver coragem, salto. No escuro. E aí, talvez, me sinta e encontre les pièces manquantes.

julho 22, 2004

os títulos são castradores. e eu sou preguiçosa.
a visita diária aos manos bengelsdorff levou-me a um sítio inesperado...
HÉCUBA


SOMBRA DE POLÍDORO

Eis-me, tendo deixado os subterrâneos dos mortos e as portas das trevas,
onde Hades vive, longe dos deuses;
eu, Polídoro, nascido de Hécuba, filha de Cisseu,
e tendo por pai Príamo que, quando a cidade dos Frígios
corria o risco de sucumbir à lança grega,
receoso, me enviou para fora do solo troiano às escondidas,
para casa de um hóspede trácio, Polimestor,
que semeia esta excelente planície do Quersoneso,
governando com a lança um povo amigo do cavalo.
Secretamente , meu pai enviou comigo muito ouro
para que, se um dia os muros de Ílion caíssem,
não fosse miserável a vida para os filhos sobreviventes.
Eu era o mais novo dos Priamidas, motivo pelo qual me
fez sair do país, já que não era ainda capaz de segurar nem o escudo
nem a lança no meu jovem braço.
Enquanto as fronteiras do país permaneceram ali mesmo,
enquanto os muros do solo troiano permaneceram intactos,
enquanto o meu irmão Heitor foi afortunado com a lança,
eu, nobremente tratado pelo homem trácio, hóspede do meu pai,
cresci como um jovem ramo, infeliz!
Quando Tróia e a vida de Heitor foram destruídas,
quando o lar paterno foi arrasado,
e o próprio pai, perto do altar erigido em honra dos deuses,
caiu, degolado pelo filho assassino de Aquiles,
mata-me a mim o hóspede do meu pai, miserável,
por causa do meu ouro, e, tendo-me morto, deixa-me
sobre as vagas do mar, para que fique só ele em casa com o ouro.
Jazo, sobre as margens, outras vezes nas ondas do mar
levado pelo contínuo ir e vir das vagas,
sem lágrimas, sem túmulo. Agora, esvoaço sobre Hécuba,
minha mãe querida, tendo abandonado o meu corpo,
há já três dias que flutuo no ar,
desde que a minha desgraçada mãe chegou de Tróia
a esta terra do Quersoneso.
Todos os Aqueus, com as naus quietas,
permanecem nas margens desta região da Trácia
pois Aquiles, filho de Peleu, aparecendo sobre a tumba,
retém toda a armada grega,
que conduzia os remos marítimos em direcção a casa,
e exige a minha irmã Políxena
como vítima submissa de um sacrifício sobre a tumba
para a tomar como prémio.
E com isso, será honrado, e não ficará sem oferendas
da parte dos seus queridos companheiros. Hoje,
é conduzida a minha irmã, eleita pelo destino, para a morte.
A nossa mãe porá os olhos nos dois cadáveres dos seus dois
filhos: o meu e o da sua desgraçada filha.
E aparecerei, para encontrar uma miserável sepultura,
no movimento das ondas diante dos pés da escrava.
Pois implorei aos poderosos do inferno
encontrar um túmulo e cair nas mãos da minha mãe.
Então, será alcançado o que eu desejava.
Retirar-me-ei para longe da velha
Hécuba, pois está já a sair de dentro da tenda
de Agamémnon, assustada com o meu fantasma.
Infeliz!
Ó mãe, que saíste da casa de reis
e viste o dia da escravatura, assim atravessas a desgraça
como um dia atravessaste a felicidade. Para equilibrar a
felicidade de outrora, algum dos deuses te arruina.


HÉCUBA

Vamos, ó filhas, conduzi a velha até casa,
para a companheira de escravatura voltar.
Troianas, a mim, outrora rainha.
tomai-me, levai-me, acompanhai-me, levantai-me
agarrando a minha velha mão.
E eu, apoiada sobre os ceptro tortos dos vossos braços,
apressarei a caminhada lenta
das articulações, avançando.
Ó brilho de Zeus, ó noite tenebrosa,
porque sou acordada assim, durante a noite,
por medos e fantasmas? Ó terra poderosa,
mãe de sonhos de negras asas,
recuso a visão nocturna, pois
tive uma visão assustadora e vi e reconheci através de sonhos
o meu filho que está a salvo na Trácia
e a minha querida filha Políxena.

Eurípides, Hecuba, vv. 1-76 (tradução minha)

julho 20, 2004

muitas vezes, andamos por aí desconcentrados e tensos, com reacções deslocadas a palavras e acontecimentos cujo significado total só se descobre dias depois.
com os músculos tensos.
à beira do colapso, à espera da inevitável má notícia do dia da semana do mês do ano, toda a energia parece convergir e acumular-se nas omoplatas, todos os dias um pouco mais.
agitados.
a um gesto mais amplo, os olhos buscam um motivo razoável. e não queremos ouvir vozes, nem carros a buzinar, nem melgas à procura de sangue.
as mãos trémulas e os joelhos fraquejantes.
e então, chega o dia em que acontece o que sentíamos nos ossos que teria de ter lugar.
uma série de coincidências, alguns encontros falhados, motoristas de autocarros que se recusam a abrir a porta a 1 metro da paragem, semáforos com deficiência crónica, estofos mornos no regional da tarde, uma viagem até coimbra.
ele estava lá. desço do comboio e ele está lá. à espera. à minha espera.
percebo nos olhos dele uma tristeza imensa, e a minha alegria transforma-se, gradualmente. deixo cair o sorriso.
percebo. o peso sai de cima do meu corpo.
e já consigo ouvir a erva e os pássaros.
e ele ainda está lá. preso numa fissura do tempo.
De repente, encontrei-me diante da minha mãe; ela desembaraçara-se de todas as restrições, arrancara a máscara e olhava obliquamente como se, com o sorriso oblíquo, se tivesse libertado do peso que a matava.
E disse:
- Não me reconheceste. Não conseguiste reconhecer-me.
- Reconheci-te. - disse-lhe eu. - Agora, repousas nos meus braços. Quando chegar o meu último suspiro não estarei mais cansado do que agora.
- Beija-me - disse-me ela -, para não pensares mais. Mete a tua boca na minha. Agora, sê feliz já, como se eu não estivesse arruinada, como se não estivesse destruída. Quero fazer-te entrar nesse mundo de morte e de corrupção, onde já sabes que estou prisioneira: eu sabia que gostarias dele. Gostava que, agora, delirasses comigo. Queria arrastar-te na minha morte. Um breve instante de delírio que eu te der, não vale o universo de estupidez onde eles têm frio? Quero morrer, «apaguei os meus traços». A tua corrupção era obra minha: dava-te o que de mais puro e violento eu tinha, o desejo de só amar o que me rasga as vestes. Estas são as últimas.
Minha mãe despiu, diante de mim, a camisa e o calção. Deitou-se nua.
Eu estava nu e estendi-me a seu lado.
- Sei agora - disse ela -, que tu me vais sobreviver e que, sobrevivendo-me, vais atraiçoar uma mãe abominável. Mas se, mais tarde, te lembrares do enlace que te vai em breve unir a mim, não esqueças a razão pela qual eu me deitava com mulheres. Não é altura de falar do farrapo do teu pai: seria um homem? Sabes bem, eu gostava de rir, e talvez ainda goste. Jamais saberás, até ao derradeiro instante, se eu me ria de ti... Não te deixei responder. Saberei, ainda, se tenho medo, ou se te amo demasiadamente? Deixa-me oscilar contigo nesta alegria que é a certeza de um abismo mais total, mais violento que todos os desejos. A volúpia em que te afundas é já tamanha, que eu posso falar-te: a ela vai seguir-se a tua derrocada. Nessa altura, eu partirei, e não voltarás jamais a ver aquela que te esperou, para só te dar o seu último suspiro. Ah! cerra os dentes, meu filho! Pareces-te com o teu caralho, esse caralho a escorrer raiva, que o meu desejo, como um punho, crispa.

Georges Bataille, "Minha Mãe" in História do Olho & Minha Mãe (Lx, Livros do Brasil, 1988)

julho 17, 2004

A dwarf came into my dreams and asked me to dance.
I knew this was a dream, but I was just as tired in my dream as in real life at the time. So, very politely, I declined. The dwarf was not offended but danced alone instead.

Haruki Murakami, The Elephant Vanishes (Vintage, 2003)

julho 15, 2004

You can walk, or you can run
You don't have to be someone

são as duas linhas que, numa tarde de verão algures no tempo, ficaram dentro de mim, com se soubessem que eu precisava delas.
o meu primeiro namorado agarrou, um dia, um lp de capa cinzenta e pô-lo a tocar no seu gira-discos (não é bom ler esta palavra de novo?) impecavelmente funcional e eis que antes mesmo de ouvir de novo aquelas palavras, já aquele som familiar e algo deslocado dançava cá dentro.
e foi assim que (re)conheci os new order.

julho 12, 2004

três anos depois de ter oferecido a voz do silêncio de helena blavatsky (lx, assírio & alvim, 1998) à marta, pego nessa obra que levou fp a traduzi-la em 1889. no ensaio introdutório, j m anes fala de um desencantamento posterior, manifestado por um seu heterónimo, raphael baldaya, iniciado nas filosofias esotéricas.
também a mim me perturbam as suas palavras, a mim que a leio pela primeira vez, incauta, mas os motivos serão certamente outros: se, por um lado, acolho a frase "funde num só sentido todos os teus sentidos, se queres tornar-te seguro contra o inimigo", outras como "mata em ti toda a recordação de experiências passadas" ganham o meu repúdio.
é verdade que vivemos numa ilusão contínua que já nem conseguimos desmembrar e que é preciso perceber pelo menos isso, que é uma ilusão, que é a transitoriedade que nos leva os dias; mas não posso concordar com o uso da mente para manter uma visão controlada e sempre consciente do carácter ilusório da vida: a mente é um caleidoscópio de reminiscências muito pessoais e só se recusa a aceder a esse fundo quem vive no medo.

julho 11, 2004

como é que se recua no desejo, no sentir o desejo?
uma vez experimentado e saciado, como podemos nós esquecer e continuar a viver como se só isso bastasse?

julho 10, 2004

os homens nunca se lembram de que é muito fácil e muito natural uma mulher sentir-se atraída por outra mulher, daí que nunca estejam realmente atentos a essa possibilidade.
no entanto, é uma forte possibilidade...

julho 04, 2004

pergunto-te quem és e o que fazes dentro de mim.
sim, em mim, no meu corpo, no ondular da minha mente, na curvatura do meu sonhar, que fazes aí, dobrado, curvado, encolhido, feto escondido? não te conheço.
o teu rosto é-me estranho. não gosto da maneira como me olhas.
e desejo-te.
Ma Mère com a sempre divina Isabelle Hupert.
O filme em si é um emaranhado de vivências da sexualidade e somente quando ela aparece e enche o grande écran com um rosto e um corpo que nos prendem, nos é dado a perceber o fio condutor da película: o jogo de luz e de sombras que é a auto-descoberta e o auto-reconhecimento, sem, contudo, haver lugar para a dúvida ou para a culpa.