já acabei de ler o prémio leya 2011: o teu rosto será o último de joão ricardo pedro (pela d. quixote). é bom.
é um daqueles romances que que nos leva à infância, que nos faz rir e chorar no mesmo parágrafo, que nos perdidos entre suspiros nostálgicos e momentos de empatia. está lá tudo o que compõe a nossa memória colectiva e tudo o que constitui o nosso património cultural, até um certo queirozianismo.
começa assim:
"Uma coisa parecia certa: no dia vinte e cinco de abril de mil novecentos e setenta e quatro, faltaria ainda um bom bocado para as sete da manhã, Celestino apertou a cartucheira à cintura, enfiou a Browning a tiracolo, verificou o tabaco e as mortalhas, esqueceu-se do relógio pendurado num prego que também segurava um calendário e saiu porta fora. O céu começava a clarear. Ou talvez nem sequer tivesse começado a clarear. Por cima das sopas de café com leite, Celestino emborcava, sem esforço, dois tragos de bagaço. O primeiro, para a azia. O segundo, para os pensamentos cismáticos, que ele, como, aliás, todos os traços fisionómicos sugeriam, era homem dado a prolongadas melancolias."
descrições pormenorizadas, o ritmo - que vai sempre variando consoante a personagem em que se concentra o capítulo -, o lirismo conseguido através de estruturas sintácticas e pontuações apuradíssimas, o sentido de humor infalível e o pormenor da data na primeira frase da obra aos momentos de entretenimento estilístico que criam o ambiente e erguem a narrativa a um patamar encantador, como este, entre tantos outros:
"Entrou no café. Tomou uma bica. Pediu uma caixa de chicletes verde. Saiu do café. Foi à praça. Comprou maçãs: um quilo e cem gramas. Peras: um quilo e setecentos gramas. Bananas: novecentos e cinquenta gramas. Morangos: um quilo. Cerejas: um quilo e quinhentos gramas. Carapaus: doze. Pescadas: duas. Robalos: quatro. Bacalhau: um. Abóbora: uma talhada. Nabos: dois. Espinafres: um molho. Cenouras: dez. Batatas: quatro quilos. Agriões: um molho. Brócolos: quatrocentos gramas. Flores: gerberas. Pão: dois de Mafra e doze carcaças. Tremoços: meio litro. Saiu da praça. Voltou a pôr os óculos escuros. Pousou cinco vezes os sacos no chão para descansar os braços. Entrou no prédio. Chamou o elevador. A luz do botão não acendeu. Subiu as escadas: três andares. Pousou duas vezes os sacos no chão: no primeiro andar e entre o segundo e o terceiro. Pousou novamente os sacos no chão para abrir a porta de casa. Largou os sacos na cozinha. Sentou-se. Esticou os braços. Esticou os dedos. Bebeu um copo de água. Levantou-se para ir à casa de banho. Mijou. Lavou as mãos. Voltou para a cozinha."
já disse que é bom, não disse?
mas a verdade é que é excelente.
Etiquetas: livros
Eu gosto de ler livros no meu tempo livre. Ontem foi jantar em hideki e meu irmão recomendado este livro. Vou comprá-lo e depois comentar se gostei ou não.
diz ...